Quando experimentamos emoções, o que acontece dentro de nós?

Psicologia

Pe. José Carlos dos Santos

            Muitos são os componentes responsáveis pelo funcionamento mental. Complexidade é, inegavelmente, um dos atributos da mente humana. As emoções estão entre os mais representativos, e igualmente entre os que mais desafiam o nosso conhecimento. O estabelecimento de princípios objetivando atingir a maturidade, e estratégias buscando controle e equilíbrio são metas que todos nos colocamos. Para muitas pessoas, as emoções são o território do que é perigoso e desconhecido. A atitude correta diante das emoções, durante muito tempo, era a desconfiança. Há antropologias em que razão é sinônimo de maturidade e equilíbrio, e emoção é sinônimo de imaturidade e imprevisibilidade. Estarão corretas estas afirmações sobre as emoções?

            Antes de mais nada, o que são emoções? Uma pessoa que se dedicou ao estudo da relação entre emoção e personalidade foi a psicóloga cristã Magda Arnold. Ela apresenta uma definição de emoção extremamente elucidativa, embora inicialmente complexa. Segundo Arnold emoções são a “atração sentida por alguma coisa intuitivamente avaliada como boa (útil), ou repulsa a qualquer objeto considerado mau (prejudicial)”.

            Esta definição nos permite perceber o que acontece dentro de nós quando experimentamos uma emoção. O ponto de partida é a percepção de algum objeto. Para que haja emoção, alguma coisa deve chegar aos sentidos, mesmo que seja em forma de lembrança. Presenciamos algum fato, vemos ou ouvimos alguma coisa, ou nos lembramos de algo que aconteceu no passado, próximo ou distante. É por isso que nas situações em que se aproxima de nós alguém emocionalmente alterado, a pergunta imediata é: o que aconteceu?

            Mas para que haja emoção, o objeto percebido é imediatamente (ou intuitivamente) avaliado de uma determinada maneira.  Segundo Arnold, quando um objeto é captado pelos sentidos, imediatamente acontece uma classificação deste objeto como sendo bom ou mau, favorável ou benéfico, perigoso ou prejudicial. Esta avaliação é imediata, e praticamente simultânea à percepção, e surgem por consequência emoções, positivas ou negativas, de afastamento ou de aproximação. Tudo acontece muito rapidamente. A razão é cronologicamente posterior. Somente num outro momento, e nos casos em que a pessoa conseguiu atingir um nível satisfatório de maturidade é que a avaliação intuitiva é submetida à avaliação racional, podendo ser por ela alterada.

            Um exemplo pode ser útil para compreender a definição apresentada por Arnold. Imaginemos a situação em que se recebe uma determinada notícia. O fato narrado é o objeto que chega aos sentidos, e que será avaliado imediatamente, intuitivamente, como sendo bom ou mau, agradável ou desagradável. A memória, factual e afetiva, poderá interferir, de modo que a notícia recebida seja avaliada como “terrível”, uma “catástrofe”, no sentido de que “não há o que fazer”, tudo está “irremediavelmente perdido”. As emoções decorrentes de semelhante avaliação intuitiva naturalmente seriam muito intensas, e de difícil controle. A situação seria diversa nas situações em que a mesma notícia seja avaliada de modo menos intenso negativamente, ou em modo favorável.

            Como se pode perceber, o componente preponderante, para o surgimento de determinado tipo de emoção, é a avaliação que se atribui ao objeto que é percebido. Normalmente há um acontecimento ao qual a pessoa atribui determinado significado. Um mesmo evento pode provocar emoções positivas numa pessoa, e emoções negativas em outra. De modo semelhante, um lugar pode ser atrativo e aconchegante para alguém, e diferentemente poderá causar repulsa e mal-estar em outra pessoa. O objeto ou evento é passível, na maioria das vezes, de receber diferentes tipos de avaliações, o que irá concorrer para o surgimento de diferentes tipos de emoções.

            Outro componente da emoção é a tendência à ação. O que acontece interiormente, o que se sente, provoca alterações fisiológicas mais ou menos intensas. A ansiedade é um exemplo. Esta emoção resulta da avaliação de um objeto como sendo perigoso, ameaçador, e fisiologicamente influencia o organismo de muitas maneiras: alteração no ritmo de batimento cardíaco, sudoração, tremor, desejo de ir ao sanitário, etc. Atitudes impulsivas podem tornar-se resultantes de emoções intensas, sobretudo quando a avaliação intuitiva não foi corrigida pela avaliação racional.

            Esta compreensão de emoções, formulada por Magda Arnold, nos ajuda a compreender comportamentos, decisões e atitudes aparentemente ilógicas. A explicação para muitos fatos pode ser muito simples: a decisão tomada foi construída a partir da avaliação intuitiva ou emotiva, e, portanto, não segue os critérios da razão. Não conseguiremos chegar ao motivo pelo qual a pessoa fez o que fez se não conseguirmos mensurar o impacto emotivo que o objeto (normalmente um acontecimento) provocou sobre ele.

            E o que nos ajuda a entender as emoções que provocam dor e sofrimento? Fatos passíveis de provocar sofrimento psíquico, e correspondentes comportamentos, podem ser os mais variados, e uma série de variáveis pode tornar o enfrentamento das emoções ainda mais desafiador. Dentre as múltiplas variáveis, destacam-se[1]: 1) Solidão e desamparo afetivo ou familiar; 2) depressão e demais transtornos de personalidade; 3) Abuso de substâncias (álcool e drogas); 4) Desesperança; 5) Antecedentes familiares caóticos ou conflitantes; 6) Saúde física frágil; 7) Realização pobre (frustração), insight pobre. 

            O pouco que vimos anteriormente nos permite afirmar que as emoções, embora complexas, não funcionam aleatoriamente e por acaso. Elas têm uma razão de ser. Obedecem determinadas leis. São componentes mentais de fundamental importância, por produzirem a energia necessária para alcançarmos os ideais que almejamos, mesmo que para isso tenhamos que superar inúmeros desafios. Contudo, se há emoções que nos possibilitam superação e transcendência, há emoções que podem provocar a completa fragmentação do funcionamento mental. Por isso, nos casos em que há a presença de emoções que provocam sofrimento, como a ansiedade e a depressão, é necessário buscar ajuda amiga e profissional o mais rapidamente possível. Todos temos direito de viver em paz, serenamente. E ninguém suporta uma carga intensa de emoções negativas, por muito tempo.


[1]SADOCK, Benjamim James. Compêndio de Psiquiatria: ciências do comportamento e psiquiatria clínica. Porto Alegre: Artmed, 2007, pag. 980.

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